Curso de especialização
em Linguagens,
Códigos e suas Tecnologias
– com ênfase no ensino médio
Universidade de
Brasília
Centro de Educação a
Distância (CEAD)
Secretaria de Estado
da Educação do Distrito Federal
MARCOS
DE OLIVEIRA BASSUL
Música na escola:
anseios, expectativas e alternativas
Brasília
(2009)
Marcos
de Oliveira Bassul
Música na escola:
anseios, expectativas e alternativas
Monografia apresentada ao Centro de
Educação a Distancia da Universidade de Brasília, como requisito parcial para
conclusão do Curso de Especialização em Linguagens, Códigos e Suas Tecnologias.
Orientadora: Profa. Me. Maria Rosário
Caxangá
Brasília
(2009)
TERMO DE APROVAÇÃO
MARCOS DE OLIVEIRA
BASSUL
Música na escola:
anseios, expectativas e alternativas
Monografia aprovada como
requisito parcial para obtenção do grau de Especialização para Professores do
Ensino Médio do Governo do Distrito Federal, do Centro de Educação a Distância,
Universidade de Brasília, pela seguinte banca examinadora:
Aprovada em
abril de 2009.
Orientadora:
Me. Maria do Rosário Rocha Caxangá
______________________________________________
Professor Convidado:
Me. André Lucio Bento
RESUMO
No segundo
semestre de 2008 o presidente Luiz Inácio “Lula” da Silva sancionou um projeto
de lei que torna obrigatório o ensino de música nas escolas que, em um prazo de
três anos, deverão estar “preparadas” para implantar a obrigatoriedade e isso
significa superar dificuldades, inserir mudanças na preparação acadêmica do
professor de música e na relação entre escola e comunidade e discutir
estratégias de elaboração e implantação de propostas relevantes e
significativas para o ensino de música nas escolas. O objetivo do presente
trabalho foi obter de professores ligados ao ensino básico em geral e ao ensino
de música no Distrito Federal, através de uma abordagem qualitativa, expectativas
e sugestões acerca de procedimentos didáticos possíveis e efetivos à aplicação
prática em sala de aula do ensino-aprendizagem musical que contemplem
estratégias dirigidas a uma educação integradora, renovadora, criativa e, acima
de tudo, valorizadora do ser humano e sua cultura. Seis professores foram
submetidos a entrevistas semi-estruturadas direcionadas a partir da questão
central da metodologia do ensino de música nas escolas e focadas na opção entre
o método tradicional ou a adoção de novas e mais acessíveis estratégias de
ensino. Emergiu da análise de dados uma expectativa unânime pela vivência da
prática musical como princípio básico para o ensino de música nas escolas bem
como da utilização de metodologias menos tradicionais, que explorem o
repertório e a cultura musical circundante. A constatação primordial desta
pesquisa é a de que novas estratégias de ensino musical, como as utilizadas na
aprendizagem de músicos populares e nas Oficinas de Música, devem ser
observadas para efetiva introdução do ensino de música nas escolas. Fica
evidente também a necessidade de inserir o aluno no estudo da música através do
seu repertório musical, independente de julgamentos de valor estético ou
técnico. Como resultante dessas e de outras constatações surgidas da pesquisa
observa-se uma necessidade urgente de atualização dos cursos de formação de
professores de música, que devem estar sintonizados com as diretrizes
implantadas para o trabalho nas escolas. Também a capacitação de professores de
outras áreas que vão atuar como “professores” de música deve-se iniciar
urgentemente bem como devem ser implantadas políticas públicas dirigidas à
melhoria das condições estruturais das escolas, à valorização do professor e ao
resgate da cultura do aluno como matéria prima da educação em geral.
Palavras-chave:
música; ensino; ensino médio; ensino de música; Lei 9.334
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO
...........................................................................................................
8
1. REVISÃO
DA LITERATURA
1.1.
Breve
visão do ensino de música no Brasil ...............................................12
1.2.
Educação Estética
.....................................................................................14
1.3.
Educação
formal e informal .......................................................................20
1.4.
Século vinte: novos sons, novas idéias ....................................................
21
2. METODOLOGIA
2.1.
Justificativa
...............................................................................................
24
2.2.
Objetivo
geral ...........................................................................................
25
2.3.
Objetivos
específicos ...............................................................................
25
2.4.
Abordagem
...............................................................................................
25
2.5.
Instrumento
e questões ............................................................................
26
2.6.
Sujeitos
.....................................................................................................
27
3. RESULTADOS
E DISCUSSÃO
3.1.
Categorização
..........................................................................................
27
3.2.
Vivendo
e aprendendo .............................................................................
28
3.3.
Afinal,
quem pode ensinar música nas escolas? ..................................... 35
3.4.
Cultura
circulante: usando o repertório do aluno .....................................
36
3.5.
É
possível ensinar música sem instrumentos? ........................................
37
3.6.
Música
na aula de música .......................................................................
39
3.7.
Respeitável
público ..................................................................................
41
3.8.
Respeitável
professor ..............................................................................
42
3.9.
“Como
é bom poder tocar um instrumento” .............................................
43
CONSIDERAÇÕES
FINAIS.......................................................................... 43
REFERÊNCIAS
............................................................................................
46
INTRODUÇÃO
Acredito
então que, sempre no contexto de nossas instituições educacionais contemporâneas,
todos gostaríamos de promover acontecimentos memoráveis, como um antídoto para as seqüência de baixa intensidade
das insípidas rotinas que tão freqüentemente parecem caracterizar o “básico”
educacional (Swanwick, 2005, p. 20).
Pensar
o homem é pensar a sociedade; pensar a sociedade é pensar a cultura; pensar a
cultura é pensar a educação. O homem desenvolve-se em sociedade através da
transmissão da cultura. Tem na educação o instrumento dessa continuidade social
que se manifesta através da renovação dos comportamentos, dos costumes e da
própria organização da sociedade. E tudo isso resulta na experiência humana.
Duarte
Jr. (1986: 59), na busca de uma definição para educação, afirma: “em termos
abrangentes pode-se entendê-la como um processo pelo qual os indivíduos
adquirem sua personalidade cultural”.
Processa-se através do aprendizado de valores e sentimentos que estruturam a
comunidade da qual fazemos parte.
Durante
séculos a educação tem se mantido ao nível da cultura dominante, atuando de
forma mantenedora nos sistemas culturais. Nos países subdesenvolvidos,
principalmente, onde encontramos uma sociedade pautada pelas desigualdades
econômicas, políticas e sociais, uma sociedade que reserva as oportunidades
educacionais às elites, a pedagogia, também subdesenvolvida, “... tende a
funcionar mais como um sistema de domesticação de consciências do que um meio
de liberar as potencialidades dos educandos, tornando a educação uma âncora que
os prende ao passado” [1].
A
Civilização Industrial, fomentadora de avanços que se dão em velocidades
assustadoras e desenvolvendo-se sob o impulso de uma educação universalizadora,
estabelecida pela relação direta entre a prosperidade econômica e social e os
níveis de escolaridade, levou a competência dos sistemas educacionais a se
orientar pela funcionalidade de sua atuação e a direcionar seus objetivos
principais à formação de mão-de-obra produtiva, resultando na fragmentação da
personalidade dos educandos. “Hoje, o saber objetivo (racionalidade) tornou-se
valor básico na sociedade e a escola mantém tal valor, reproduzindo o que
ocorre na própria sociedade – a ruptura entre razão e emoção (que é mantida e
estimulada) ”[2].
A
rapidez dos sistemas tecnológicos, confiando às máquinas tarefas físicas e
rotineiras, determinou ao homem o controle das informações e a responsabilidade
pelo trabalho intelectual, gerando uma “crise ainda em curso, para cuja
resolução os paradigmas tradicionais parecem ser ineficazes” [3].
Isso faz com que o passado perca sua autoridade como fonte do saber e do
aprendizado, legando às novas e futuras gerações a responsabilidade pela
participação ativa nas discussões dos referenciais que embasam a percepção e a
interpretação da realidade, na busca de alternativas inovadoras, adaptadas a
uma realidade dinâmica, longe da estabilidade do passado.
Frente
aos desafios que se apresentam no mundo moderno, necessário se faz a construção
de um novo homem, integrado à sua cultura e capacitado para tomar decisões de
forma criativa e prática. Tal como ela se processa hoje, a educação não
responde satisfatoriamente a essa imensa responsabilidade que é a de estruturar
novas formas de relações sociais. Tudo isso nos leva à necessidade de uma
mudança na postura pedagógica, envolvendo educando, educador, escola, governo e
comunidade e voltada para uma visão de mundo integral, onde a cultura, o
cotidiano, as emoções e a criatividade trabalhem juntos.
No
segundo semestre de 2008 o presidente Luiz Inácio “Lula” da Silva sancionou um
projeto de lei que torna obrigatório o ensino de música nas escolas. Esse
projeto formalizou-se como alteração do artigo 26 da lei 9.394, de 20 de
dezembro de 1996, artigo esse que dispõe sobre os currículos do ensino
fundamental e médio e impõe, em seu parágrafo 2º, que o ensino da arte será
deles componente obrigatório. O que a nova lei traz de novidade é a instituição
legal e potencial do ensino da música nas escolas, que foi diluído nos
currículos em meio ao ensino de arte em geral e, por dificuldades de várias
espécies, nunca se concretizou efetivamente, ou mesmo, nunca existiu, como
ensino de música. O que a nova lei ainda não traz são os mecanismos que serão
usados para a sua implantação em meio a uma realidade contaminada pelos vícios
pedagógicos e pelas dificuldades logísticas a que estão sujeitas nossas escolas
públicas.
Em um prazo de
três anos as escolas deverão estar “preparadas” para implantar a
obrigatoriedade e isso significa superar dificuldades imensas relativas aos
profissionais, às metodologias, aos conteúdos, às gestões etc. Significa
mudanças na preparação acadêmica do professor de música e na relação entre
escola e comunidade. Significa também a discussão de estratégias de elaboração
e implantação de propostas relevantes e significativas para o ensino de música
nas escolas.
Muitos são os
setores da sociedade interessados e/ou envolvidos nesse processo desde a
aprovação da Lei de Diretrizes e Bases, em 1996. Algumas questões já vêm sendo
levantadas por professores, teóricos, artistas e associações na busca de
definições e direcionamentos. Os relatos na literatura apontam para um
envolvimento docente nessa busca muito centrado no pesquisador, no
especialista, menos do que no professor regente do ensino básico.
O objetivo do
presente trabalho é obter de professores ligados ao ensino básico e ao ensino
de música expectativas e sugestões acerca de procedimentos didáticos possíveis
e efetivos à aplicação prática em sala de aula do ensino-aprendizagem musical e
que contemplem estratégias dirigidas a uma educação integradora, renovadora, criativa
e, acima de tudo, valorizadora do ser humano e sua cultura.
A questão
básica que direcionou a pesquisa foi: como se deve ensinar música nas escolas
aos alunos do ensino básico? Optou-se pelo sistema de entrevistas
semi-estruturadas para coleta de depoimentos abertos e espontâneos.
Considerando-se a especificidade do tema que, em seus conteúdos, principalmente
os mais atuais, se distancia do conhecimento do público em geral, as
entrevistas foram conduzidas em torno das propostas de ensino tradicional de
música ou de práticas informais e/ou não-tradicionais, bem como das
possibilidades de trabalho com aprendizagem, vivência e expressão musical.
Foram
entrevistados seis professores, e a escolha dos participantes não se deu em
direção a áreas específicas de atuação, a não ser as de trabalho no ensino
básico e/ou no ensino da música, este, mais evidente a nível técnico. Os
sujeitos representaram uma pequena parcela de um vasto universo conceitual
envolvido no trabalho de professores das mais diversas matérias e de
profissionais da educação envolvidos em amplos e variados setores.
O presente
trabalho se divide em quatro partes: a primeira constitui a revisão da
literatura que fundamentou a pesquisa, principalmente voltado para a educação
estética, para a aprendizagem musical informal e para as propostas atuais no
campo da oficina de música, expectativas essas relevantes nos depoimentos
colhidos.
A segunda
parte detalha o desenvolvimento da pesquisa, apresentando o método, o
instrumento de pesquisa, os participantes e os procedimentos metodológicos
usados para coleta e análise dos dados.
A terceira
parte apresenta os resultados obtidos a partir dos depoimentos dos
entrevistados, os quais colocaram opiniões diversificadas e expuseram
livremente suas ansiedades.
Na quarta e
última parte os resultados são discutidos, as conclusões são descritas e
relacionadas à literatura pertinente e algumas sugestões são colocadas como
propostas para novas discussões e pesquisas.
1.
REVISÃO DA LITERATURA
1.1. Breve
visão do ensino de música no Brasil
Duarte
Jr. (1986: 120) situa a educação no Brasil a partir de uma “... visão da cultura brasileira como um todo, o que,
em si, é altamente problemático” já que é uma cultura de contornos não bem
definidos e repleta de diferenças regionais marcantes, principalmente em termos
econômicos.
Nossa
educação tem origem em um processo colonial, absorvendo a sociedade um
transplante cultural que se processou através da importação da cultura
européia. Em 1816, o príncipe-regente importa
uma série de artistas franceses, funda a Academia de Belas –Artes, “considerada
o germe inicial de nossa educação artística” (DUARTE JR, op. cit., p. 122), que se revelou mais como uma imposição de
valores, com a chegada de uma tendência neoclássica, vigente na Europa e que
“... provocou a suspeição e o arredamento popular em relação à Arte ”[4].
Afastando-se a arte do contato popular, reservando-a para os talentosos,
concorria-se para alimentar um dos preconceitos contra a arte, como uma
atividade supérflua, um babado, um acessório da cultura “[5],
concentrando-se o ensino de arte no Brasil, até 1889, na “... “produção de
bens, incluindo aí o desenho técnico e geométrico” (Duarte Jr, op. .cit. p. 122). As escolas oficiais, então, eram destinadas às classes
trabalhadoras enquanto que as “belas-artes”, ensinadas em escolas, academias e
conservatórios especiais, atendiam as classes mais abastadas.
A
partir da Semana de Arte Moderna, em 1922, descobriu-se novas formas de
entendimento da expressão artística e a arte infantil passou a ser olhada como
“... apresentando um valor estético ligado à espontaneidade da criança. Ou
seja: a arte, para a criança, deixou de ser vista por muitos como uma
preparação do intelecto ou uma preparação moral, para ser encarada também como
a liberação de fatores emocionais e a expressão de experiências” [6]. A
música era ainda incluída eventualmente nos currículos escolares como uma
atividade de lazer, sob o nome de “canto orfeônico”, ”... onde o aluno ouvia o
mestre tocar ou cantava, com o seu acompanhamento, os hinos do país e algumas
outras canções[7]”.
Na
década de 60, principalmente após 1964, sob a égide da “modernização” do país e
através da implantação de modelos de “desenvolvimento”, outras culturas,
principalmente a norte-americana, passam a ser adotadas no país, resultando
numa repressão significativa dos valores culturais próprios e na adoção de
valores estranhos á nossa cultura. Através da censura, restringe-se a
circulação de idéias, principalmente no que tange à produção artística
nacional, eliminando ou controlando o espírito crítico. Uma arma fundamental
para a realização de tal postura foi a televisão, que, chegando aos mais
recônditos lugares, impunha a todos uma forma de pensar e sentir, esvaziando
manifestações artísticas regionais e folclóricas.
A
lei 5.692/71, voltada para a formação de mão-de-obra especializada e para a
reforma do ensino superior, inclui em sua “letra” a obrigação da educação
artística no ensino de 1°
e 2°
graus. O que parece contraditório segundo Duarte Jr. (1986: 131) é que a lei
“... permite que se possa falar no caráter ‘humanizante’, ‘formativo’ do nosso
sistema educacional que, tão voltado ao homem integral, até incluiu a arte em
sua formação”. Mas o buraco existente entre a “letra” da lei e sua aplicação
(seu espírito) mostram a
impossibilidade de tal realização efetiva, pois não se ofereceram condições
reais (econômicas e materiais) para sua implantação. Cursos de licenciatura
formavam professores de arte que eram responsabilizados por todas as áreas de
artes nas escolas. “A literatura da área tem apresentado críticas a respeito
desta formação polivalente, mostrando que não é possível preparar adequadamente
um professor de tantas áreas artísticas num prazo tão curto de tempo, que são
os quatro anos da universidade” (Figueiredo,
2008: 3). Apesar de algumas universidades abolirem essa estratégia e se
dirigirem à formação específica do professor, muitas escolas ainda preferiam os
professores polivalentes. Isso causou uma evasão de professores de música para
as escolas especializadas e para o ensino particular, enfraquecendo e
superficializando o ensino de música nas escolas (FIGUEIREDO, op. cit.).
Ainda
segundo Figueiredo (2008), as iniciativas seguintes, como a LDB de 1996 e os
Parâmetros Curriculares Nacionais, apesar da mudança do termo Educação
Artística para Artes, não são claras em relação a qual o tipo de arte e que
profissional será responsável pelo seu ensino. Mesmo a liberdade de elaboração
de projetos político-pedagógicos pelas escolas foi cerceada pela “... tradição
da polivalência, a conveniência econômica de se contratar um único professor
para todas as artes, a lentidão no processo de entendimento e aplicação de
novos parâmetros educacionais” (FIGUEIREDO, op.cit.),
contribuindo assim para que o ensino das artes nas escolas brasileiras ainda
conviva com a prática polivalente, a superficialidade de abordagens e a
ausência significativa de profissionais licenciados na área de música atuantes
nas escolas de educação básica.
Nesse
momento em que a música ganha seu espaço potencial dentro da sala de aula
algumas soluções têm sido buscadas por profissionais da educação e da música no
intuito de se encontrar soluções para o efetivo ensino da música nas escolas.
Alguns cursos de licenciatura em música vêm se ajustando ás determinações das
Diretrizes Curriculares Nacionais para os cursos de Música “... o que tem
promovido uma discussão importante sobre a formação de professores de música
capazes de lidar com a diversidade de contextos onde a educação musical pode
acontecer” (FIGUEIREDO, op. cit.).
1.2.
Educação
Estética
Rubem
Alves, prefaciando Duarte Jr. (1986), se apresenta:
E aqui está alguém que sugere que a educação seja pensada a partir da
beleza – o que equivale a afirmar que o poeta e o músico são mais importantes
que o banqueiro e o fabricante de armas, o que sem dúvida provocará sorrisos
tanto nos vencedores quanto nos vencidos (p. 11).
Repensar
a educação sobre uma perspectiva artística, como atividade estética talvez seja
o que de mais produtivo se encontre ao nosso alcance para realizar uma mudança
radical na formação educacional.
O
conhecimento humano é resultado de sua capacidade de atribuir significações,
portanto a consciência do homem é fruto de sua dimensão simbólica. Através dos
símbolos o homem transcende a esfera física e biológica e ele e o mundo se
tornam compreensíveis. Segundo Duarte Jr. (1986), anteriormente a essas
simbolizações do pensamento, está o expererienciar,
um “colocar-se” em relação aos acontecimentos, às situações, que compreende
aspectos para além da consciência simbólica, no qual se incluem percepções e
estados afetivos (p. 16).
Assim,
configura-se um processo onde o sentir
e o simbolizar se articulam na
formação do conhecimento do mundo.
Contudo, não há linguagem que explicite e aclare
totalmente os sentimentos humanos. Não se pode, nunca, descrever com palavras
como é a dor de dente ou como é a ternura que estamos sentindo. O conhecimento
dos sentimentos e a sua expressão só podem se dar pela utilização de símbolos
outros que não os lingüísticos; só podem se dar através de uma consciência
distinta da que se põe no pensamento racional. Uma ponte que nos leva a
conhecer e a expressar os sentimentos é, então, a arte, e a forma de nossa
consciência apreendê-los é através da experiência estética [8].
Isso
nos leva a considerar a educação, sob um ponto de vista mais abrangente que uma
simples transmissão de conhecimentos, como um processo formativo do ser humano,
que o auxilie e oriente sua ação no mundo, transcendendo, assim, os limites da escola
para se situar no próprio contexto cultural onde ela se dá. Atinge a educação
uma dimensão estética ao levar o educando à criação de valores e sentidos que
direcionem sua ação no meio cultural em busca de uma coerência e harmonia entre
o sentir, o pensar e o fazer.
Aprender,
segundo Rubem Alves (citado por Duarte Jr. 1986: 22), é: “preservar a
experiência testada, para usá-la no futuro. A aprendizagem é a transformação de
uma experiência que se poderia perder no passado numa ferramenta para conquistar
o futuro”. A memória, neste sentido,
evita que os comportamentos se percam, subsidiando, desta forma, atividades
definidas e eficazes em substituição ao primitivo jogo de ensaio e erro. A memória biológica[9]
transmite às gerações de indivíduos respostas características das ações básicas
que o habilitarão a se manter vivo, e que dali não podem ser removidos[10].
Quando
nos reportamos ao homem, de cara distinguimos uma característica peculiar: o
homem não nasce programado biologicamente para a sobrevivência, sendo a sua
infância a mais longa de todos os seres vivos. “Não há nenhuma relação
determinada entre seu organismo e sua atividade, como no caso dos animais” [11].
Essa característica reflete-se num importante aspecto: o homem, ao invés de
adaptar-se à natureza, procura transformá-la para adaptá-la às suas
necessidades. O homem age, enquanto o
animal reage, e o faz através da
organização simbólica da natureza, através dos símbolos com os quais ele
interpreta o mundo.[12]
Essa experiência simbólica permite ao homem o ato da reflexão, através do qual ele, distanciando-se do seu corpo, pode
voltar-se sobre si mesmo e descobrir-se no tempo, evocando o passado e o
futuro, acrescentando um sentido à vida biológica que faz com que o homem não
apenas viva mas exista, e procure um
significado para o fato de fazer parte dessa roda que é nascer, viver
(construir) e morrer.
No
que diz respeito à aprendizagem, no homem ela não se dá de forma mecânica, mas
sim em termos de significação. Transforma-se a experiência em símbolos através
da significação, e esses símbolos são guardados e somados àqueles já
existentes. “O ato de conhecer é, portanto, um ato de re-conhecer: a
constatação da concordância entre dados sensórios novos e as formas
memorizadas” (Rubem Alves, citado por Duarte Jr., 1986: 26). Já não se trata
mais de apenas buscar o equilíbrio biológico mas também a “coerência
simbólica”. Portanto, o conhecimento é resultado de uma atitude valorativa e
emotiva do ser humano. A razão, ou seja, a reflexão, fundamenta-se no seu encontro
com o mundo, e as construções mentais somente recebem um significado em
referência à vida vivida, experimentada.
Duarte
Jr. (1986, p. 29) distingue três fatores implícitos na aprendizagem: o interesse, calcado nos valores
atribuídos ao mundo; a memória, que
permite a retenção dos significados; e a transferência,
que permite interpretar e agir sobre situações com base em referenciais retidos
anteriormente. Adquirir novos significados quer dizer, então, a mobilização de
conceitos e experiências. “O significado possui assim uma dimensão sentida (vivida) e uma simbolizada (refletida)”.
A
constatação fundamental de tudo isso é que só se adquirem novos conceitos
quando estes se referem às experiências de vida. O que experimentamos do mundo
é sentido antes de ser compreendido. Esse processo (ordenar o
mundo numa estrutura significativa) implica uma fragmentação da experiência
sensória que torna a realidade concebível, memorizável e até mesmo previsível.
Isso é a imaginação: “... a forma mais fundamental de operação da
consciência humana. Os animais não têm imaginação. Por isto nunca
produziram arte, profetas ou valores”.[13] A
imaginação dirige e orienta a aprendizagem.
Relacionando
o que foi exposto à educação, podemos dizer que educar é dar condições ao
indivíduo de conviver com os significados flutuantes em sua cultura, num
processo ativo que o permita conhecê-la a partir de suas próprias vivências,
desenvolvendo uma capacidade crítica que o leve a compreender e selecionar os
significados nos quais se basearão sua ação enquanto indivíduos. A experiência
estética chama para si essa função pois permite a apreensão do mundo de maneira
direta e total, sem a mediação de conceitos e símbolos, numa relação em que os
sentimentos entram em consonância com as formas vindas do exterior.
Herbert
Read (citado por Marin, 1976: 21)
conceitua a arte como
Um modo de integração entre percepção e sentimento. Quando a
estruturação de percepções e sentimentos acontece, surge uma visão pessoal do
mundo, e que se pode dizer, fundamento de uma ou várias obras de arte. O
resultado da percepção no cérebro é a imagem; esta é a retenção do real
percebido (percepto). Imaginação artística, um dos elementos da criação, é a
capacidade de relacionar as imagens entre si, estabelecendo combinações no
processo de sentimento, na reação efetiva a toda estimulação acima citada.
Partindo
de uma breve análise da história da arte verificamos que a sensibilidade
artística sempre esteve presente no cotidiano da população. “Uma das mais
trágicas injustiças da nossa civilização tecnológica é que a sensibilidade
natural dos homens que em outras épocas encontrava um escoadouro nos
artesanatos básicos acha-se agora completamente suprimida ou encontra uma saída
patética em algum ‘hobby’ trivial” [14].
Voltando nosso olhar para a evolução histórica da civilização em direção ao que
se denomina “mundo moderno”, observamos transformações em todas as atividades,
inclusive, na atividade artística. Sendo esta um produto essencialmente humano,
tal evolução levou-a a mudanças em sua natureza e técnica, bem como ao
sentimento e interpretação das outras atividades.
O
fato da arte se manter presente na vida do homem desde os seus primórdios
revela a necessidade de comunicação humana e a sua capacidade de
sensibilizar-se com as experiências. Refletindo a época através da forma como
se orientam impulsos interiores, afetividade, escolha de temas e formas, a obra
de arte age como o meio, impressionando aqueles que a contemplam e fomentando
reações das mais variadas espécies.
A
preocupação de se colocar a arte como parte integrante da educação formal vem
de muito tempo. Platão, talvez o ponto de partida para todas as reflexões,
dizia que a arte deve ser a base da educação. Sigamos com Marin (1976: 3-9)
algumas posições de teóricos a respeito: Schiller, segundo Read (1957), talvez
tenha sido o primeiro a levantar a questão frente aos educadores, baseando-se
na espontaneidade e na capacidade criadora específica, visando uma formação
integral do ser humano. Já a partir
deste século, com o movimento da Escola Nova, passou-se a considerar a arte
como parte integrante da formação do educando. Para o próprio Schiller (1963) a
arte livra o homem de influências negativas, tornando-o pleno de moralidade,
melhorando a sociedade. Quando o impulso formal domina, o estado da pessoa
rege-se pela moralidade; quando dominam os impulsos sensíveis, rege-se o homem
por estados subjetivos, variáveis, físicos. Cabe à educação proporcionar o
equilíbrio entre ambos, permitindo o desenvolvimento dos dois impulsos. Dessa
harmonia surge um terceiro impulso: o lúdico, considerado por Schiller como o
“estado ideal, o estado estético, a que todo homem deve aspirar, pois o homem
só é homem, em seu sentido pleno, quando o atinge”. Para Whitehead (1969) a
arte na educação é condição necessária à sobrevivência da civilização através
da não dissociação entre a vida estética e a vida intelectual. Para Dewey
(1959) a arte é um meio de enriquecimento de sentimentos e pensamentos e tem
aspectos que visam o social e outros que visam o pessoal, estes realizados
segundo esforços imaginativos. “A arte deve ser a expressão de seu
relacionamento com outras atividades”. Para Elliot Eisner (1963) a
arte-educação atua no sentido da melhoria de qualidade do pensamento. “As
organizações das reações do indivíduo à sua própria criação artística, às
qualidades classificadas e selecionadas, vão dar a medida da qualidade da
inteligência”. Gloton (1965), na França, discorre sobre a arte nas escolas como
meio “... para a consecução de fins nacionais e sociais, de formação da moral,
iniciação à vida coletiva, educação da afetividade, formação do gosto,
desenvolvimento do aluno como um todo numa adaptação harmoniosa ao mundo”. Para
Piaget (1968), a arte é importante na educação por constituir uma forma de
satisfação às necessidades da criança e de adaptação ao real. “É um meio de
conciliar e sintetizar duas realidades: uma pessoal e outra material e social”.
Notamos
que a educação estética caminhou em um desenvolvimento pessoal através da
maturação promovida por combinações entre hereditariedade e experiências
pessoais, levando a situações de extremo valor para a sociedade. Para que se
realize plenamente na educação é necessário uma reforma total do ensino, “[...]
de forma que arte passasse a ser o seu núcleo” (Read, citado por Marin, 1976,
p. 7). Voltamos a Platão !
1.3. Educação
formal e informal
“Estamos entrando em uma nova era da educação, que é programada para a
descoberta e não para a instrução” [15].
Distinguimos
dois tipos de educação: uma educação informal, adquirida no convívio com outras
pessoas e uma educação formal, ou intencional, tarefa essa destinada a alguns
em particular e que se processa através de uma ação proposital dos educadores
sobre os educandos, “... influenciando, dessa forma, as futuras gerações na
identificação e escolha das alternativas para a resolução de seus problemas”
(Drefhal, 1998, p. 126).
O
equilíbrio entre essas duas forças
deve ser enfatizado e buscado através da valorização da prática, do que
realmente tem aplicação, ou melhor, daquilo que interessa. A exclusividade
oferecida à instrução formal, desvinculada da experiência, da vida prática nada
contribui para a socialização e autonomia, objetos primários da educação nos
dias de hoje. Para Drefhal (1998) “a
educação é aqui entendida em seu sentido mais amplo, como um processo social
dialético, formal e informal, de organização da estrutura cognitiva e de
socialização das crianças e dos jovens” (p. 126).
Na
música há profissionais que atuam em todas as áreas e não tiveram a educação
musical formal pela qual outros passam em conservatórios e academias de música.
Lembro-me de ter ouvido de Paul McCartney em uma entrevista ao jornalista Larry
King, responsável por um programa de entrevistas na CNN Americana de
repercussão mundial, que ele não sabia ler ou escrever uma nota musical. Para
muitos deve ser difícil imaginar um músico multiinstrumentista (contrabaixo,
piano, voz, violão, etc.), arranjador, produtor, uma das grandes cabeças dos
Beatles, que não saiba “ler música”.
Na
verdade, grandes músicos que conhecemos só buscaram o aprendizado formal da
música depois que conquistaram um espaço e obtiveram condições financeiras que
facilitaram e o fizeram no intuito não de aprender música, mas sim de
aperfeiçoar a música que já tinham aprendido. Na verdade, todos sabem “ler
música”, mas a sua maneira. A música é a mesma!
Esse
tipo de aprendizagem musical, encontrada em grande escala em músicos populares,
vem sendo sistematizada por alguns pesquisadores e podemos encontrar trabalhos
que evidenciam esse processo de aprendizado informal peculiar do músico
popular. Segundo Green (2008), a maioria dos músicos populares aprendem música
por um processo de “enculturação”, que é a imersão do indivíduo na sua própria
cultura, de forma continuada, aprendendo geralmente por um processo de imitação
que envolve também compor, tocar e escutar música.
Segundo
Recôva (2005: 15) “a organização e a forma como os conteúdos musicais são
ensinados se diferenciam e sofrem influência constante das transformações
sociais, culturais, religiosas, políticas e econômicas do mundo”. A oralidade
configura-se como uma das formas de aprendizagem de músicos, que aprendem
ouvindo, olhando, experimentando e principalmente vivenciando a prática
musical. Mesmo depois do surgimento progressivo da escrita musical, como a
conhecemos hoje, durante muito tempo o ensino de um instrumento ainda se dava
de forma oral e não havia separação entre professores de instrumento e de
teoria musical. (RECÔVA, 2005).
1.4.
Século vinte: novos sons... novas idéias
Lembro-me
do depoimento do professor Rafael Guimarães, coordenador pedagógico-musical do
Projeto Cariúnas[16], no I
Simpósio de Sociologia em
Educação Musical , em Belo Horizonte ,
2008. Dizia ele que quando criança gostava muito de desenhar porque via em sua
frente uma folha em branco sobre a qual poderia desenhar qualquer coisa que
quisesse. Já mais maduro, quando resolveu estudar música, descobriu que não
tinha na sua frente uma folha em branco, estavam querendo adestrá-lo.
Para
Schaefer (1991: 285) a música é “...assunto fundamentalmente expressivo, como
as demais artes, como a escrita criativa, ou como os vários tipos de fazer” mas
a ênfase destinada à teoria, à técnica e à memória levou a musica a assumir o
papel de ciência acumuladora do conhecimento. Dessa forma não vive o seu
grandioso papel que deveria ser o de libertar e exercitar a energia criativa e
a mente “na percepção de suas próprias criações” (ibid: 286).
O
advento da música contemporânea no século vinte, de experimentalismo abundante
e novos pontos de vista estético-musicais; as novas formas tecnológicas de se
produzir, registrar e manipular a informação sonora e a influência da mídia e
dos meios de difusão musical trouxeram no seu rastro uma variedade de produções
e expressões musicais. A conseqüência foi a criação de novos paradigmas e novas
formas de linguagem baseadas em novas formas de relações sócio-culturais
(vídeoclip, DVD, mp3, internet, pendrives, ipods, etc.).
A
música utiliza essas tecnologias de diferentes formas “...desde a concepção de
novos e modernos instrumentos musicais, a geração e síntese de novas
sonoridades, a simplificação do trabalho de notação musical, a facilitação do
processo composicional, o surgimento de novas técnicas no que tange à gravação
e à reprodução musical, até o auxílio no processo de educação e aprendizagem
musical” (MARINS, citado por RECÔVA, 2005: 20).
Revelando
a matéria-prima da música - o som - como componente expressivo em composições
musicais, a música do século vinte e seus compositores experimentalistas
trouxeram para a educação musical alternativas baseadas no conceito de oficina
de música.
O
conceito de Oficina de Música é ainda um conceito em formação. Há uma
diversidade de práticas que se utilizam do título oficina e há, até mesmo, uma enorme variedade de material sobre o
qual se trabalha com esta metodologia – oficina de teatro, oficina literária,
oficina gastronômica. Apesar dessa diversidade, pode-se, desde já, observar
alguns pontos de intenção: foco na criatividade e na experimentação; objetiva a
socialização criativa e avaliativa; promove o desenvolvimento do aluno através
da descoberta de suas potencialidades enquanto pessoa.
Segundo
Terraza[17] a
idéia de oficina pode ser entendida de mais de uma maneira e inclusive utilizada
para diferentes propósitos, embora o ideal seria que não houvesse deturpações,
para não confundir um processo de aquisição de uma estrutura de pensamento como
uma forma de ‘alta recreação’ (quando abordada como disciplina), e como ‘vale
tudo’ (quando abordada como processo composicional).
Para
Antunes [18], é uma
metodologia adotada “junto ao educando, de modo que ele cresça
intelectualmente, interligado ao crescimento da cultura de sua época”
necessitando de “permanente prática, na sala de aula, da cultura e da estética
de nossa época”.
Carvalho
(1987) [19]
define Oficina de Música como “... uma metodologia do fazer musical a partir do
contato direto com diversas fontes sonoras, visando à criação musical”. Sua
atuação “... é mais abrangente quanto à formação do aluno enquanto pessoa, do
que outro curso tradicional apenas de transmissão de conhecimentos (apesar de
não poder ser usada para tal fim)”.
Outras
várias definições podemos encontrar, mas já é o suficiente para notarmos que
Oficina de Música é uma expressão que designa um modo de ação sobre um campo de
conhecimento abrangente mas que relaciona alguns termos evidentes como: contato
direto com o material sonoro, prática, criatividade, objetivo definido de
criação musical, apreensão da cultura de época, dinâmica e outros tantos
ligados à pedagogia musical.
Segundo
Fernandes (1993: 104) a Oficina de Música é ativista; teoriza em função da
necessidade; revela a aprendizagem pela descoberta; capacita para o trabalho
autônomo, reflexivo, crítico, transcendente e relacional; induz ao crescimento
pessoal relacionando-o à cultura da época; incentiva a estruturação sonora; não
controla as variáveis no processo criativo; situa a música dentro de um
universo sonoro; possui normas a serem seguidas; manifesta-se no “fazer
musical”; é abrangente quanto à formação pessoal; é interdisciplinar; atende a
um público variado; exerce-se através de uma ação direta do aluno com o som;
desenvolve o autoconhecimento, a auto-expressão e análise; e muito mais como
veremos no decorrer do trabalho. Revela-se na pedagogia da Oficina de Música a
valorização do processo de aprendizagem mais do que seu produto.
2.
METODOLOGIA
2.1. Justificativa
Durante muitos
anos, a metodologia de pesquisa em aprendizagem seguiu os rumos de uma tradição
“... de acordo com a qual se deveriam estudar as ciências sociais assim como se
estudam as ciências naturais: a verdade somente poderia ser alcançada por meio
da experiência e da observação sistematizada” (RECÔVA, 2006: 43).
Distanciando-se da prática, a pesquisa perdeu de vista o sujeito da vivência,
aquele que se tornou, de uns tempos para cá, o centro de interesse científico
de estudos que buscam compreender os processos, relacionar e promover a
interação de diversas áreas do conhecimento.
Segundo
Lüdke; Marli (1986), a mudança
natural de todo ser vivo, resultado de uma fenomenologia fluida, exige
pesquisas no âmbito da educação que se movimentem entre os conhecimentos
acumulados e as transformações sociais. “Um dos desafios lançados à pesquisa
educacional é exatamente o de tentar captar essa realidade dinâmica e complexa
do seu objeto de estudo, em sua realização histórica” (LÜDKE; MARLI, op. cit. p. 5). Na pesquisa escolar isso
significa voltar-se para a sala de aula e o funcionamento da escola.
2.2. Objetivo geral
Identificar a receptividade, anseios, expectativas e pontos de vista de
professores da Secretaria de Estado de Educação do Distrito Federal a respeito
da obrigatoriedade do ensino de música nas escolas de nível básico.
2.3. Objetivos específicos
·
Obter opiniões de professores a respeito do ensino
obrigatório de música nas escolas.
·
Elencar dúvidas, anseios e sugestões em relação às atuais
condições gerais das escolas em relação ao ensino de música.
·
Relacionar propostas metodológicas coerentes com as expectativas
e os anseios dos sujeitos e que podem ter aplicação funcional e prática na lei.
2.4. Abordagem
Uma
abordagem[20] que vem
sendo muito usada nas pesquisas em educação é a abordagem qualitativa que tem,
segundo Bogdan e Biken, citado por Lüdke; Marli (op. cit.), cinco características básicas importantes: a) tem o
pesquisador como instrumento e o ambiente como fonte de dados; b) o material
coletado é rico em descrições pessoais; c) o foco é o processo, não o produto;
d) valoriza as visões pessoais dos sujeitos; e) o envolvimento do pesquisador
na análise dos dados é grande, pois envolve abstrações e reflexões indutivas.
As
características elencadas acima colocam a abordagem qualitativa em sintonia com
as expectativas deste trabalho porque dirigem a pesquisa para o contexto, para
o prático e para o dinamismo participativo da educação. O que se quer é ouvir
as ansiedades, as expectativas de quem está em sala de aula vivenciando as
transformações e as relações sociais bem de perto. As aulas de música, como se projetam
daqui pra frente, não têm personalidade formada ainda e qualquer que seja o
caminho que sua estruturação pedagógica irá tomar, acredita-se que este é o
momento de ouvir o professor, aquele que convive diariamente com cada aluno e
em cada modelo diferenciado da cultura brasileira.
2.5. Instrumento
e questões
Um
dos procedimentos de coleta de dados mais utilizados nas pesquisas em ciências
humanas é a entrevista, uma técnica na qual “o pesquisador visa apreender o que
os sujeitos pensam, sabem, representam, fazem e argumentam” (SEVERINO, 2007).
Seguindo os passos de Ludke; Marli (op.
cit.) utilizou-se o esquema de entrevistas semi-estruturadas em torno de
uma questão central: como se deve ensinar música nas escolas no ensino básico?
Um roteiro elaborado através dos seguintes tópicos guiou as entrevistas como
forma de conduzir e auxiliar os sujeitos através do tema:
·
Deve-se priorizar a aprendizagem
ou a vivência musical? Em que etapas?
·
Deve-se ensinar música nas escolas
do ensino básico de forma tradicional ou de forma não-tradicional e/ou
informal?
·
Seria possível a professores de
outras áreas, sob capacitação, ministrar vivências musicais com os alunos e
promoverem um contato com a música sem a teoria musical tradicional?
·
Seria viável um sistema no qual a
Escola de Música de Brasília, de nível técnico, absorve-se os alunos do ensino
médio que tivessem maiores aptidão e interesse para um aprendizado efetivo da
música?
2.6. Sujeitos
Os sujeitos
deste trabalho são professores do ensino básico do Distrito Federal e sua
escolha se deu aleatoriamente, respeitado o critério de diversidade de áreas de
ensino. Todos são do círculo de conhecimento do autor e tinham conhecimento, de
alguma forma, da existência do trabalho, o que possibilitou, em todas as
entrevistas, um clima de sintonia, abertura e transparência. Todos ficaram
cientes antes da entrevista da proposta de trabalho e dos objetivos da
pesquisa. As entrevistas se deram em locais diversos que não afetaram em nenhum
momento a coleta dos dados, tornando irrelevante, portanto, sua descrição.
Duraram em média quinze minutos, os professores tiveram total liberdade de se
expressar e foram consultados sobre a revelação de suas identidades, com a qual
todos consentiram. As entrevistas foram gravadas e degravadas pelo autor,
transcritas apenas nos trechos relacionados aos temas relevantes, e foram outra
vez ouvidas durante a análise dos dados, buscando reavivar questões.
Foram
entrevistados: um professor de educação física, em regência em todo o ensino
básico; uma professora em cargo de Orientadora Educacional; uma professora de
educação infantil e atendimento especial de ensino Braile; um professor em
regência de História e Teoria da Música na Escola de Música de Brasília; um
professor de Geografia em regência no ensino médio; uma professora de violão em
regência na Escola de Música de Brasília;
3.
RESULTADOS E DISCUSSÃO
3.1. Categorização
Em um mundo
como o de hoje a falta de uma verdade absoluta e de teorias perfeitas leva a
formas diferentes de se olhar e interpretar a realidade. “Dentro dessa
diversidade é que se aprende a conviver com a visão individual, coletiva e
democrática das formas de pensar e agir sobre a realidade” (RECÔVA, 2005: 52).
A análise do discurso, portanto, envolve constatações a partir de seus elementos
constituintes acrescidas de emoções, desejos e receios, que revelam as
individualidades latentes nos indivíduos.
Dessa forma, a
partir da análise dos dados das entrevistas, algumas categorias de dados
emergiram como unânimes e outras foram elencadas a partir de anseios
individuais, surgidos durante os discursos. Após essa categorização os
discursos foram novamente a elas relacionados e outras subcategorias surgiram e
acrescentaram informações pertinentes.
A análise dos
resultados teve como referência duas categorias principais:
1. Vivência ou
aprendizado musical no ensino de música nas escolas?
2. É viável a
capacitação de professores de outras áreas para ministrar aulas de música?
A partir dos
questionamentos levantados outras subcategorias surgiram relativas a materiais
musicais, equipamentos, instrumentos, contexto, repertório e o papel da Escola
de Música no processo.
3.2. Vivendo e aprendendo
O
ensino-aprendizado da Música, na sua forma mais tradicional, traz uma carga
muito grande de mistério e inacessibilidade aos olhos do público em geral. Diferentemente
das Artes Plásticas ou Cênicas, por exemplo, que se utilizam de linhas, cores e
gestos - signos presentes no cotidiano das pessoas - para se fazer representar,
a Música, na sua forma de representação tradicional utiliza uma linguagem
gráfica inerente e só aplicável a ela mesma. Pode-se observar no depoimento de
alguns entrevistados esse distanciamento simbólico que a “matéria” Música
carrega. Em alguns depoimentos sobre a progressão do ensino musical, observa-se
nas entrelinhas e nas inflexões esse “mistério” que é a linguagem musical tal
qual se lhes apresenta:
Eu acho que é
possível, mas aí entrar em formação já... é eu não sei exatamente... parte de
notas musicais, toda aquela formação ... experiências globais, ...mais novos e
mais à frente fazendo as opções por aquela... aquela maior aptidão em uma... em
uma atividade ou outra, dentro da música (professor Paulo, Educação Física,
ensino médio);
...e é
lógico, no ensino fundamental seria uma coisa assim bem mais light, vamos dizer
assim ... não ter a parte de instrumentos... só no ensino médio... pra ter essa
continuidade (professor Kleber, Geografia, ensino médio).
De certa
forma, todo mundo sabe que a Música se aprende, mas têm esse aprendizado como
algo distante de sua compreensão ou mesmo vinculado a um dom natural:
... levar essas
crianças que têm naturalmente uma aptidão, um dom, que eu já percebi, dentro da
minha família, são seis irmãos, duas irmãs tinham o dom e foram desenvolvidas e
hoje são... tem uma que é professora de música também mas que, durante muito
tempo, viveu da música, com o próprio aprendizado (professor Paulo, Educação
Física, Ensino Médio)
O
ensino musical vem há muito tempo transferindo e fixando conhecimentos
importados, conhecimentos estes que refletem uma realidade que não é nossa e
nos está muito distante espacial e temporalmente, criando barreiras quase
intransponíveis à interpretação de sua simbologia que, desvinculada da
realidade prática no ensino musical, acaba também se tornando um objeto
abstrato e inacessível a uma maioria de “pobres mortais não músicos”.
”Vejo a música como
assunto fundamentalmente expressivo, como as demais artes, a escrita criativa,
ou como os vários tipos de fazer. Ela é isso, deveria ser assim, porém, com a
ênfase dada à teoria, à técnica e ao trabalho da memória, a música torna-se
predominantemente uma ciência do tipo acumulação de conhecimento” (SHAEFER,
1991, p. 285).
A
música transcende quaisquer limites que a ela tenham submetido quaisquer
culturas em quaisquer épocas. Se por um lado a sistematização sob a qual se
desenvolveu durante séculos permitiu seu estudo, registro e difusão, por outro
criou um casulo dentro do qual grande parte da música foi alimentada e dele não
mais saiu, até agora.
Novas
tecnologias e novos conceitos a respeito da exploração da matéria sonora
juntamente com a prática musical cotidiana se ampliando a cada dia e a
multiplicação de portas de acesso a músicas de diversas culturas disponíveis
hoje na sociedade exigem estratégias diferentes das utilizadas nas viciadas
metodologias de ensino musical, construídas sobre um repertório europeu de
séculos atrás. Marshall McLuhan, citado por Shaefer (1991, p. 286) dizia que
“estamos entrando em uma nova era da educação, que é programada para a
descoberta e não para a instrução”.
... e mesmo porque
esse ensino formal aí que a gente
tem vem de um modelo francês, conservatório francês. (professor Wellington, História da Música e Música Popular
Brasileira, ensino técnico)
Seguindo
os caminhos que traçam as Orientações Curriculares para o Ensino Médio, em
direção a uma aprendizagem significativa, encontramos a noção de que “o
objetivo do ensino de linguagens é desenvolver as capacidades de produzir
textos (emissor) e interpretar textos (receptor)” (p. 180). Para isso indica
que:
“é importante conhecer os códigos (ou seja, os
elementos e as estruturas básicas das diversas linguagens: verbal, visual,
sonora, corporal e suas mixagens); conhecer os canais (materiais, suportes, veículos,
isto é, os meios de comunicação antigos e atuais, tradicionais e tecnológicos)
e conhecer o contexto” (p. 180).
Considerando o contexto como zona de
interesse de emissor e receptor, sugerem que conhecer, vivenciar, experimentar
e compreender o seu e o contexto dos outros, bem como os materiais, canais e
códigos aumenta a zona de interesse tornando o aprendizado significativo.
Pesquisas feitas por Grossi (2003)
revelaram no contexto do ensino da Percepção Musical a existência ainda de
“problema na abordagem limitada da música uma vez que não considera as formas
com que as pessoas vivenciam e respondem à música” (p. 1). Segundo a autora a
diversidade e riqueza de manifestações musicais levam à necessidade de uma
aproximação que considere as “dimensões de resposta à música”, ou seja, como as
pessoas respondem ao que ouvem.
Que dimensões são essas? Swanwick
(citado por Grossi, op cit), detectou
quatro dimensões de respostas à música: as que dão ênfase aos materiais
da música (valorização do som e elementos musicais); à expressão
(associação de com sentimentos e estados emotivos); à forma (como se organizam os materiais da
música) e ao valor (significância
em particular) às quais Grossi (2003) acrescentou mais duas: contextual
e ambígua.
O que observamos no atual sistema de
educação musical é um processo inibidor, limitado e modelador da criatividade
onde a “música criativa é progressivamente difamada e passa a não existir”
(SHAEFER, 1991). Alguns relatos dos entrevistados sobre ensinar música a partir
da teoria musical, como vemos hoje na maioria das escolas e academias, ou
através da vivência prática e auditiva trazem alguns dados:
...não, eu acho que
não faz sentido, mesmo porque, como eu falei anteriormente, essa questão da
realidade aí, ela é completamente multiplural. Eu não vejo sentido você pegar
uma criança que mal dá conta de segurar um lápis pra ficar fazendo semibreve.
Melhor experienciar, vivenciar o som (professor Wellington, História da Música
e Música Popular Brasileira, ensino técnico).
Se você apresenta pra
determinado aluno primeiro a notação, antes de trabalhar a vivência musical,
isso vai trazer pra ele algumas limitações. Então, o principal seria trabalhar
essa vivência musical, trabalhar essa experimentação com som, ele conhecer o instrumento,
conhecer as possibilidades do instrumento, compor (professora Simone, Percepção
e Estruturação Musical e Violão, ensino técnico).
Experiências globais
para os mais novos e mais à frente fazendo as opções por aquela maior aptidão
em uma atividade ou outra, dentro da música, né? (professor Paulo, Educação
Física).
...e que esse ensino
fosse ministrado de uma maneira diferente, pelo menos com as crianças,
começasse com uma musicalização como primeiro contato com a música e depois
fosse mais sistematizada, mais gradualmente, de maneira mais lúdica,
acrescentando a formalização. Primeiro a vivência, depois o ensino. (professora
Gisela, Ensino Infantil e Educação Especial)
Dois consistentes depoimentos
revelam posições que não estão em total sintonia com a aplicação da lei:
Em minha opinião, nem
todo mundo tem que tocar, nem todo mundo e nem todo mundo quer tocar, assim
como nem todo mundo quer jogar basquete, na educação física, vôlei. Então, a
música deveria, nesse momento realmente mais integrador, inicial, das pessoas
até se relacionarem, a música tem um momento de interagir, trabalhar em grupo e
um momento posterior mais específico. O pessoal deveria escolher uma das artes,
um dos esportes, e não ser direcionado, todo mundo toca, todo mundo toca
música, todo mundo toca instrumento. Que não é a finalidade na obrigatoriedade.
(professora Simone, Percepção e Estruturação Musical e Violão, ensino técnico).
Muito mais
interessante seria resgatar a idéia inicial das escolas parque, aonde você vai
lá, faz aula normal e no turno contrário você vai e freqüenta, faz educação
física, faz artes plásticas, teatro, e outras oficinas. Não necessariamente só
as linguagens artísticas. O esporte é uma coisa superimportante que também tem
que parar com essa estória de recreação, porque isso aí, o meu medo também
muito disso aí é uma aula que tende a virar recreação (professor Wellington,
História da Música e Música Popular Brasileira, ensino técnico).
A
obrigatoriedade do ensino da música não pode incorrer na presunção de achar que
todos têm que ser músicos e/ou tocar um instrumento e nem pode se limitar aos
festivais de música de colégios ou música no recreio.
Os
entrevistados foram unânimes em relação às estratégias de ensino da música nas
escolas, no sentido de que a vivência musical deve ser o ponto de partida de
todo esse processo.
Trabalhar basicamente
em cima de três pilares, que seriam o compor, o criar e a percepção, o ouvir.
Compor, criar e ouvir. Trabalhar muito a questão da audição, desenvolver muito
a questão da audição. E a questão do pentagrama, isso seria um ensino mais
especializado. Vem, ele vem, mas inicialmente vem a questão de uma vivência
musical, pegar no instrumento, tocar em banda, ter uma vivência em grupo,
inicial, não essa questão da notação (professora Simone, Percepção e
Estruturação Musical e Violão, ensino técnico);
...prática musical,
auditiva, prática, fazer não precisa ser virtuose, mesmo porque os virtuoses
são pouquíssimos e esses aí, durante o processo, se você detectar, você encaminha
para uma instituição mais especializada (professor Wellington, História da
Música e Música Popular Brasileira, ensino técnico);
Acho que sim (sobre
começar o ensino de música pela vivência e prática musical), até mesmo porque
os alunos do terceiro ano estão escolhendo as áreas de atuação deles, as
profissões, os cursos que eles vão seguir. Então, essa parte instrucional seria
mais voltada mesmo para o ensino médio, eu acho que teria mais validade
(professora Lúcia, Orientadora Pedagógica, ensino médio).
Segundo Martins (2009: 53) “o grau
de domínio dos conceitos exige uma habilidade mental crescente para interpretar
e fazer generalizações”. No caso da notação musical, os signos só devem ser
introduzidos depois que o educando adquirir suficiente prática da linguagem
musical e esta surgir como “resposta a uma necessidade”. Considera que o
professor deve despertar, encorajar, manter e preservar a capacidade inventiva
da criança, proporcionar-lhe o conhecimento de suas possibilidades, dando a ela
condições de se expressar, de manifestar suas expectativas e fantasias. A
educação musical deve começar por oferecer ao aluno oportunidades de
descoberta, criação, exploração, manipulação e experimentação com o material
sonoro.
Este ponto de
vista é reiterado pelos teóricos da Oficina de Música que consideram que “o
compositor, para agir diretamente no som, teve que aprender a ‘sujar as mãos’
com a matéria sonora, pesquisar, analisar, inventar para após, finalmente, ter
condições de construir sua própria composição” (SILVA, 1983). Terraza (s/d),
discorrendo sobre a metodologia da Oficina de Música, enfatiza que esta deve
provocar a aquisição de uma estrutura de pensamento, e não apenas transmitir
informações.
Atualmente as
pesquisas com processos de aprendizagem informal de música têm trazido novas
luzes sobre uma pedagogia que existiu desde sempre, mas somente agora vem sendo
estudada e sistematizada. Em sua tese Recôva (2006) constata em entrevistas com
músicos populares que:
...aprender sozinho, brincando, explorando o
universo sonoro a partir do instrumento musical, em um contexto de
independência foram aspectos bastante presentes na fala dos participantes.
Outros aspectos importantes, tais como o papel da família, dos amigos, da
cultura regional e dos primeiros professores, foram também enfatizados (p. 56).
Também
o caráter interativo e participativo da aprendizagem musical ficou relevante na
pesquisa de Recôva (2006) que observou que:
Os
entrevistados relataram também ter aprendido a tocar um instrumento musical a
partir do convívio com amigos, que já tocavam ou que ainda estavam no processo
inicial de aprendizagem. O interesse pela música, bem como a escolha de
repertório e do instrumento, também foi influenciado por essa rede social. Com
o intuito de formar uma banda, por exemplo, essa roda de amigos acaba por fazer
uma divisão instrumental meio que aleatoriamente, aproveitando quem já toca e
incentivando os demais a aprenderem um instrumento que está faltando (p. 59).
3.3. Afinal, quem pode ensinar música nas escolas?
Esta é uma
questão parcialmente resolvida pelo veto do Presidente de República ao artigo
da lei que limitava o ensino de música nas escolas a professores de música.
Apesar do veto, é uma questão contraditória que merece ser futuramente revista
e suscitou depoimentos relevantes nas falas dos entrevistados. Sobre a
viabilidade de capacitar professores de outras áreas para ministrar vivências
musicais básicas foram colhidos depoimentos significativos:
Eu acho que poderia
sim ser um professor da área de artes que tivesse uma capacitação adequada pra
fazer o trabalho, eu acho que não teria nenhum problema. Não precisa ser uma
pessoa especializada pra trabalhar essa parte
(vivência) (professora Lúcia, Orientadora Pedagógica, ensino médio).
É talvez seja
possível... com... eu acho que... orientação, com orientação, a parte básica
né... de estímulos né. eu acho que é possível, mas aí entrar em formação já...
é eu não sei exatamente... parte de notas musicais, toda aquela formação... eu
acho que... (professor Paulo, Educação Física).
Nota-se acima
certa indecisão gerada talvez pela associação do ensino da música com o ensino
das notas musicais.
Pode ser, lógico que
é, com certeza. Tem tantas pessoas que transitam tão bem no mundo da música, no
mundo da literatura, no mundo teatral, tem várias pessoa, quer dizer, se você é
um ator e vai fazer um musical, tem que lidar com música, então vai entrar com
música, e mesmo porque se amplia o mercado de música ele é muito mais amplo do
que a gente imagina. A gente tem a idéia errada de achar que pra ser músico
você tem que ser necessariamente instrumentista, virtuose, de preferência, que
toca cinco mil notas por segundo (professor Wellington, História da Música e
Música Popular Brasileira, ensino técnico).
Abaixo podemos observar depoimentos
que convergem para a presença de pelo menos um professor de música em cada
escola:
eu acredito que a
melhor forma seria ter um professor de música em cada escola Se fosse essa
parte de vivência da música, eu acredito que poderia ser feito sim, mas a
sistematização do conhecimento musical teria que ser feito por um professor de
música (professora Gisela, Ensino Infantil e Educação Especial).
Com certeza. A
demanda é muito grande, faz parte de uma realidade que vai ter que ter música
em todas as escolas e não tem profissionais formados, gente pra cobrir em todas
as escolas. O ideal seria que realmente um professor de música fosse dar aula
em cada local desse. Mas não é a realidade (professora Simone, Percepção e
Estruturação Musical e Violão, ensino técnico)
Com relação à
introdução da disciplina música, pra mim o professor tem que ter uma
especialização. Pode até ser que ele não seja músico, mas que ele tem que ter
uma especialização. Eu não sei como seria isso. Já que isso foi descartado, que
pra mim era fundamental, né porque eu to passando por essa experiência na
aceleração... eu sou professor de geografia e estou dando aula de inglês. Pra
mim foge completamente da normalidade. Eu concordo plenamente com isso. Agora,
esse processo tem que acontecer antes, antes de ter a introdução dessa
disciplina. porque se não uma coisa vai atropelar a outra e até mesmo pra saber
se o professor, se ele tem, essa, como é que se diz... se ele vai realmente...vai se adaptar a essa
nova metodologia. Então, pra mim tem que acontecer antes a capacitação pra ver
se realmente o professor tem condições de ministrar essas aulas (professor Kleber, Geografia,
ensino médio).
Essa é uma real
dificuldade a ser resolvida em três anos. Como formar professores de música
para cumprir a lei em todas as escolas de nível básico do País? Essa é uma
constatação que alguns dos entrevistados usaram como justificativa para sua
aceitação em relação à capacitação de outros professores para o ensino da
música..
3.4. Cultura
circulante: usando o repertório do aluno
Pierre Boulez, citado por Mársico
(1989), compositor do século vinte que se tornou um líder filosófico no
movimento artístico pós-guerra, em favor de maior experimentação e abstração,
diz que
“aprender música não é fazer considerações
teóricas desligadas de qualquer prática; não é debruçar-se sobre um instrumento
até conseguir o domínio técnico que permita executá-lo adequadamente, não é
esforçar-se para armazenar os signos convencionais – chave do vocabulário
musical”
e segue perguntando: “por que não
começar pelo contato com o material sonoro que se encontra ao alcance da mão,
transformando-o em instrumento de música?”
A diversidade musical existente hoje
em todas as culturas, e isso nós temos de sobra aqui no Brasil, é material de
estudo para muitos séculos e revela possibilidades estratégicas também
diversificadas para o ensino da música.
Eu acho que as
escolas têm autonomia para definir metodologicamente o que pretendem. Mesmo
porque as realidades das escolas aí são completamente diferentes,
diferenciadas, não há uma unidade física, um perfil, assim, digamos, um
caráter, é tudo muito diversificado. Como é que você vai pegar, por exemplo,
uma escola do interior da Paraíba, do Acre, você tem um repertório ali que
pertence àquele meio e talvez as coisas sejam bem mais interessantes você
trabalhar em princípio com esse repertório (professor Wellington, História da
Música e Música Popular Brasileira, ensino técnico).
...desenvolverem um
trabalho... no ritmo que eles vivem no momento, que... tem o batuque, tem o
rap... eles desenvolverem o som que eles gostam (professor Paulo, Educação
Física).
3.5. É
possível ensinar música sem instrumentos?
Outro problema que se apresenta para
a real, didática e motivadora aplicação da lei é a dificuldade de obtenção de
recursos financeiros para estruturação logística da maioria das escolas
brasileira.
Eu acho que primeiro
as escolas tinham que ter um equipamento,
uma estrutura que pudesse atender a forma mais adequada do aprendizado.
(professor Paulo, Educação Física).
Nem todos os
alunos têm condições de adquirir um instrumento e nem toda escola vai poder
disponibilizar um para ele ou talvez nem mesmo adquirir um tocador de cd.
Eu acho que tem que
ter um instrumento, pode ser canto, pode ser flauta doce, tem que ter um
instrumento, pode ser violão, pode ser piano. Tem que ter um instrumento. Ele
tem que estar tocando, ele tem que estar tocando. É uma ferramenta porque, me
parece que o mais importante nessa lei, por exemplo, o aspecto mais
interessante dela, reside no fato de se ter contato com o fazer musical, porque
não creio que seja a idéia principal, primordial formar músicos, não vejo que
seja por aí (professor Wellington, História da Música e Música Popular Brasileira,
ensino técnico).
Essa primeira parte,
a questão dos instrumentos, é uma questão muito séria, é um problema que,
realmente, se o professor não tiver jogo de cintura, não souber como lidar com
isso vai virar uma... é um problema muito sério, é um problema real. A solução
principal é essa mesma: você trabalhar principalmente com a questão percussão,
percussão corporal, trabalhar com a voz, trabalhar com a expressão. Mesmo não
sendo instrumentos tradicionais, desde a época das oficinas de música já se trabalhava
com essa questão da criação e não necessariamente precisava ter os
instrumentos. Apesar de que hoje em dia a gente já tem alguns instrumentos bem
acessíveis. Os alunos têm instrumentos, nem todos, mas isso não pode ser um
fator que iria limitar. E no ensino médio sim, seria uma coisa mais específica
(professora Simone, Percepção e Estruturação Musical e Violão, ensino técnico)
Eu acho que todas as
escolas como têm a educação física deveriam ter aulas de música com uma área
que eles pudessem criar os instrumentos
deles, dentro da escola como uma oficina, uma oficina de música. Como existe educação física, toda escola tinha
que ter uma oficina de música (professor Paulo, Educação Física).
Observam-se aqui duas posturas um
pouco divididas. Por um lado manifesta-se a necessidade de contato com um
instrumento, mesmo que não vá aprender a tocá-lo de forma efetiva, mas que se
possa trabalhar com ele. Por outro lado, há a constatação de que, apesar de
ideal, isso seria uma limitação que afetaria principalmente aqueles menos
favorecidos que não teriam como adquirir um instrumento, mas que essa tarefa
pode se desenvolver com outro tipo de instrumental menos convencional, nas
fases iniciais, como o corpo ou a voz.
3.6. Música
na aula de música
Surgiu desta pesquisa em primeiro plano e de forma unânime a constatação
de que, no ensino musical, a vivência
deve ser a porta de entrada. De onde vem essa certeza que cada um tem a
respeito do ensino musical mesmo sem conhecimento de seus signos e de suas
relações? Se abrirmos uma revista na sala de espera do dentista provavelmente
encontraremos alguma matéria sobre como a música faz bem para o ser humano,
como é bom para a criança conviver com a música desde cedo, ouvir, brincar,
tocar, como isso ajuda em seu desempenho escolar e afetivo e etc., etc. Outro
dia li uma que mostrava: “estatisticamente,
os músicos são cidadãos com menores taxas de crime, quando comparados com o
resto da população”. Mas o que a música exatamente tem a ver com isso? Será que
é o estudar, o tocar, o criar, o trabalhar
ou o quê é o responsável por essa influência tão benéfica que, de tão aparente,
já faz parte do senso comum?
Há um tempo recebi um aluno de faixa etária em torno de cinqüenta anos
que tinha saído de um acidente vascular e tinha sido encaminhado à escola para
estudar música como forma de terapia auxiliar no tratamento. Essa é uma visão
integrada ao senso comum sob outra direção: a de que a música faz bem para a
saúde. Sou professor em uma escola de nível técnico, na qual o ensino é voltado
para a formação profissional e onde o currículo é denso, os professores e as
tarefas são muitas e as cobranças também. Não acho que estudar música em uma
escola técnica seja terapia. Talvez para uns poucos. Outras dinâmicas musicais
certamente seriam mais apropriadas para o caso.
O evidente é que, em qualquer tipo de trabalho com música, ouvir, tocar,
criar ou qualquer outro em que a participação seja integrada, a vivência deve
estar presente em todos. O
contato com a música, direto, de forma atuante, ativa ou passivamente, é o que
faz a diferença.
Isso está presente também nas novas direções que tem tomado a pedagogia
musical em geral. A
experiência com a música, o ouvir e o fazer musical em suas mais diversas
formas, têm se tornado o eixo central de novas teorias no ensino da música até
mesmo a nível de graduação. Quanto mais próximo da música estiver o indivíduo,
quanto maior seu grau de comprometimento com ela, mais forte a marca que ela
deixará impregnada na personalidade. Mársico (1989) chega a colocar que “a
experiência musical necessita estar ligada ao corpo” de modo que a totalidade
da pessoa se ligue ao fato sonoro através da multiplicação das sensações e
finaliza o parágrafo alertando que o corpo é o “grande esquecido do sistema
escolar atual”.
Aqui surge a certeza de que, antes de qualquer aproximação aos signos
musicais, antes de qualquer teorização sobre procedimentos ou conteúdos, e isso
vale para todas as idades, a vivência
musical deve fazer a sua parte. Ouvir e experimentar a música são os primeiros
passos. Ouvir a música que gosta, aproximar-se de sua estética de forma lúdica
e gradual, usando a sua linguagem, não a da música; criar música a partir de
sua inspiração pessoal, usando a totalidade do material sonoro existente e os
motivos que representam os anseios individuais. Cada um faz a música que quer.
Cada um ouve a música que gosta.
Aqui se esboça uma sugestão: sigamos os passos dos que trabalham com
Oficina de Música e vamos tomar o som em geral como material experimental para
aproximarmos nossos alunos da música; vasculhemos as dinâmicas de Shaefer em
busca das paisagens sonoras e vamos levá-las aos alunos para que construam suas
próprias, com os sons que estão a sua volta, com os sons que carrega consigo;
vamos usar o corpo como instrumento, levar o aluno a percuti-lo, a percutir com
ele, a usar a voz dentro de sua expressividade e capacidade. Vamos ouvir música
junto com nossos alunos e conversar com eles sobre ela.
3.7. Respeitável
público
Experiências pedagógicas contemporâneas vêm introduzindo o ensino
musical a partir do ouvinte, o responsável por dar significação à música
através da sua prática auditiva. As pesquisas sobre dimensões de respostas
auditivas à música revelaram categorias de respostas individualizadas, mas
integradas a uma cultura e a um repertório dominante. Então, para ser bom
músico é preciso ser bom ouvinte.
O fazer musical inclui ouvir, tocar e criar e, segundo Grossi (2003), a
audição é a única que está presente em todas as três atividades e envolve não
somente captar os sons, mas também a apreciação estética, “pensar e refletir
sobre a música”. Esse é um tipo de vivência que pode direcionar o ensino de
música no nível médio. Afinal, não creio que a intenção da aprovação da lei
seja formar músicos. Vejo como maior objetivo o de inserir a música no processo
educativo do cidadão. Para isso não é preciso ensinar notação musical ou uma
teoria sem prática sobre um repertório estranho ao aluno. Já que se faz música
para o ouvinte, se começarmos trabalhando o ouvido estaremos formando, em
primeiro lugar, bons e conscientes ouvintes e, quem sabe, atentos e criativos
músicos. Ensinar o aluno a ouvir música de forma intencional pode ser um fator
de aproximação a zonas de interesse comum e despertar motivação e socialização.
Também emergiu da pesquisa a necessidade de se usar o repertório do
aluno como material de trabalho, ao invés de exemplos musicais estranhos a ele
e a sua própria cultura. Esse também é um ponto que vem ganhando unanimidade na
comunidade musical em geral e acredita-se que o ensino de música tem que
considerar em primeiro plano a cultura local, regional, nacional, a cultura do
rádio, da televisão, da internet. As ofertas são muitas e é sobre elas que se
deve aproximar o aluno da música. O ouvinte é o alvo - se ninguém ouvir não é
música, já sugeria Umberto Eco a respeito da arte - e o próprio músico é seu
primeiro ouvinte.
3.8. Respeitável
professor
Uma questão
que suscitou divergências foi sobre a capacitação de professores de outras
áreas para ministrarem as aulas de música em nível de vivência musical.
Observa-se nos depoimentos que professores especializados em música têm uma
resistência maior a essa abertura, apesar de um deles se mostrar consciente da
dificuldade de, na atual conjuntura, formarmos professores de música
suficientes e achar que essa poderia ser uma saída para este momento. Os
professores de outras áreas se mostraram mais abertos a essa adaptação, alguns
mais flexíveis e outros condicionaram a uma capacitação efetiva. Essa pode ser
uma solução para os alunos de nível fundamental, desde que suas aulas sejam
direcionadas para a vivência prática da música, de forma lúdica e experimental,
na qual o professor não interfere a não ser para coordenar e orientar o grupo.
Para isso professores de outras áreas, sob capacitação prévia, poderiam
preencher espaços que certamente ficarão em aberto por todo o território.
Uma das
preocupações evidentes em um dos depoimentos é a de que aulas de música com
professores de outras áreas podem levar a estratégias mais recreativas do que
educativas. Esta é uma preocupação compartilhada por este autor. Acredito que
pode ser uma solução viável e momentânea desde que trabalhada com ênfase na
capacitação prévia e dirigida desses professores que atuarão na área de música,
para atuarem com os alunos do nível fundamental. Os alunos do nível médio, e
isso também surgiu como consenso entre os que são pela capacitação, devem ter
um ensino mais especializado, conduzido por professores de música, capacitados
para o ensino e abertos aos anseios dos alunos.
Também surge
das considerações transversais presentes nas entrevistas que o aluno de nível
médio que tenha interesse e/ou aptidão pelo estudo aprofundado de algum
instrumento pudesse ser absorvido por escolas públicas ou conservatórios de
música, como, por exemplo, a Escola de Música de Brasília, a partir de
encaminhamento de seus professores de música nas escolas, e sob condições
definidas. Isso abriria um campo enorme para o trabalho com a música nas
escolas porque mudaria o foco do aprendizado da música (deixado para os que
tivessem real interesse no seu estudo) para o da apreciação e vivência musical,
o que realmente interessa dentro desse contexto.
3.9. “Como
é bom poder tocar um instrumento”
A instrumentalização da escola e do
aluno foram questões levantadas por alguns dos entrevistados e estas são
dificuldades evidentes e inerentes a nossa realidade social. Percebe-se em
depoimentos dos professores não ligados a música uma preocupação maior com a
questão da vivência musical elencando a questão do estudo instrumental como
atividade posterior e dirigida a interesses mais específicos. Em depoimentos
dos professores especializados em música observa-se uma preocupação grande em
relação a isso, no sentido de que o instrumento tem que estar presente,
qualquer que seja ele, mesmo que o aluno não vá aprender a tocá-lo ao estilo
dos virtuoses, mas que possa produzir sua música com ele. Um dos entrevistados
se revelou mais flexível em relação ao que pode ser o instrumento e sugeriu que
o próprio corpo possa ser usado para tal fim, assim como a voz.
Fica evidente que o instrumento deve
estar presente no ensino musical em atividades de produção e criação e que esse
instrumento pode ser qualquer um, um piano, uma flauta doce ou um apito, a voz,
os pés, as mãos ou o corpo inteiro. Atividades de audição, análise e percepção
musical não exigem a utilização de instrumentos e podem promover excelentes e
instigantes aulas de música. Evidente também é que as escolas vão ter que se
equipar, no mínimo, com alguns aparelhos de som e alguns instrumentos.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A partir do que foi levantado e
exposto, algumas sugestões vêm a tona na intenção de contribuir com a discussão
ainda inicial de como aplicar a lei sem que ela se fixe apenas como mais um parágrafo
na Constituição Federal:
a)
ao
nível fundamental, as aulas de música poderiam ser dirigidas exclusivamente ao
ouvir e ao fazer musical, usando o corpo, a voz, os sons ao alcance da mão e
mesmo instrumentos de percussão, quando possível. Também é possível e útil o
trabalho experimental com sons indiferenciados, os quais podem ser produzidos a
partir de qualquer objeto a mão, que, nesse momento, se torna o instrumento
musical. O importante aqui é dar vazão à expressividade e à criatividade do
aluno e introduzi-lo na audição intencional e atenta, através da qual poderá
absorver gradualmente conceitos sobre os materiais musicais;
b)
ao
nível médio, aulas voltadas para a percepção intencional, para a escuta atenta
e criativa da música, aprendendo a identificar dimensões de respostas
auditivas; aulas de criação musical em grupo com ou sem o uso instrumental. A
preparação para o aluno concorrer ao vestibular, no que concerne às questões
ligadas à música, tem que ser considerada. Também o vestibular, nesse ponto,
tem que ser considerado já que o nível médio traz em suas funções a de preparar
o aluno para tal;
c)
Os
cursos de licenciatura em Música são a preparação para os que vão estar em sala
de aula e por isso mesmo têm que ser repensados em suas metodologias para que
contemplem uma nova realidade no ensino musical. Esta pesquisa não contemplou
os professores que ministram as aulas de graduação na licenciatura e é de
fundamental importância que sejam ouvidos e que debatam a questão;
d)
políticas
do governo em parcerias com empresários ligados ao ramo da música –
instrumentos, escolas, estúdios, gravadoras, lojas de CDs e outros - poderiam
promover a instrumentalização de várias escolas e a execução de eventos. A
música é fonte de público, o músico atrai gente, onde tem gente, tem sempre um
empresário querendo aparecer;
e)
para
finalizar, é preciso um pouco mais de criatividade administrativa nas escolas;
maior interesse pela sua administração; maior curiosidade e disposição para
buscar alternativas efetivas e criativas. Precisamos de idéias!
Este trabalho não pretendeu abranger
toda a dimensão do problema que é muito maior do que se apresenta aos nossos
olhos. O fato de envolver uma atividade ainda não presente no contexto a que se
refere direcionou a coleta de dados para a entrevista semi-estruturada, ficando
de fora processos de observação que, futuramente, devem ser realizados,
principalmente nos ambientes de trabalho com práticas alternativas de educação
musical, inclusive fora das escolas públicas.
Também deve ser superado o limite
geográfico sobre o qual esta pesquisa se desenvolveu, tendo em vista a
grandiosidade do território brasileiro e a diversidade de culturas e condições
sociais a que se submete boa parte de nossos alunos. Esta é uma questão que
deve ser verificada antes de se definir qualquer estratégia, sob o risco de
esconder e reforçar a exclusão que já se manifesta em larga escala.
É preciso encontrar estratégias para ensinar música nas escolas de forma que se
contemplem os aspirantes e os não aspirantes a carreira de músico, que se
adéqüem às mais diversas realidades culturais, sociais e econômicas do País e
que reforcem e despertem a motivação intrínseca à música e não deixem que aulas
de música se tornem aulas de “música dos outros”. A nossa diversidade musical é
muito grande e está esquecida nos discos de folclore do MEC, nas iniciativas
culturais de bancos e de grupos musicais que se propõe a resgatar nossas
origens. Somos um país de musicalidade natural, fisiológica, genética. Temos
que aproveitar isso!
REFERÊNCIAS
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TERRAZA, Emílio.
Oficina Básica de Música, para que? A metodologia de “oficina”, apostila (sd).
[1] Veloso & Albuquerque, citado por Drefhal (1998). Decisões políticas para a educação brasileira. Uma retrospectiva
histórica e os desafios da transitoriedade. (In Humanidades, p.127)
[2] Fernandes, J. N. (1993, p 15). Análise das oficinas de música no Brasil
enquanto metodologia de educação musical,
p. 15
[3]
Drefhal, H. (op. cit, p. 127.).
[4] Barbosa (citado por Duarte Jr., 1986: 123).
[5] Ibid
[6] Duarte Jr. (1981, p 114).
[7] Todavia, há que se ressaltar a
iniciativa de inúmeros educadores e artistas que procuraram, paralelamente ao
ensino oficial, fundar e desenvolver as ‘Escolinhas de Arte’, nascendo a
pioneira em 1948, no Rio de Janeiro, por iniciativa de Augusto Rodrigues. E,
ainda, a célebre experiência (duramente reprimida) dos Ginásios Vocacionais
que, coordenados pela prof. Maria Nilde Mascellani, deram à arte um lugar ao lado das
outras ‘disciplinas (Duarte Jr., 1986: p 125).
[8] Duarte Jr., J. F. (1986). Fundamentos
estéticos da educação, p. 16
[9] A expressão memória biológica foi tomada de empréstimo por Duarte Jr. a Rubem
Alves ({Notas introdutórias sobre a
linguagem} e significa, segundo o primeiro, a “própria programação
organística do animal”.
[10] Interessante uma olhada no livro de
Carl Sagan, Os dragões do Éden. “ A
biologia assemelha-se mais à história do que à física; os acidentes, erros e
circunstâncias felizes do passado determinam poderosamente o presente. Ao
abordarmos problemas biológicos tão difíceis, quais sejam a natureza e a
evolução da inteligência humana, parece-me pelo menos prudente conferir
razoável peso aos argumentos derivados da evolução do cérebro (p. 19).
[11] Duarte Jr., J.F. Op. cit. p. 22.
[12] Um símbolo é uma estrutura, um objeto,
uma coisa, um sinal que representa algo,
existente ou inexistente, e por seu intermédio pode-se apreender o mundo como
uma totalidade.
[13] Langer, Suzanne K. (citada por Duarte
Jr., op. cit. p.42).
[14] Educação,
arte e criatividade São Paulo: Pioneira, p. 2.
[15] Marshall McLuhan, citado por Shaefer (1981: 286):
[16] Para conhecer o Projeto Cariúnas
acesse: http://www.cariunas.org.br/principal.htm
[17] Terraza, E. Oficina Básica de Música, para quê? A metodologia de oficina, apostila (s.d.).
[18] Antunes, J. In Fernandes (1993), op. cit.,
p. 101.
[19] Apud
Fernandes, J. N. op. cit.., p. 102.
[20] Severino (2007: 119) sugere o uso do
termo abordagem ao invés de pesquisa ou metodologia: “são várias metodologias
de pesquisa que podem adotar uma abordagem qualitativa, modo de dizer que faz
referência mais a seus fundamentos epistemológicos do que propriamente a
especificidades metodológicas”.
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